Há pouco mais de 4 anos eu tive o prazer de entrevistar uma
galerinha em Ubatuba, com idade entre 13 e 15 anos, que estava dando um show em
tecnologia. Esta moçada, simplesmente construiu um satélite, o Tancredo 1,
dentro do Projeto UbatubaSat. Ele já foi para o espaço. Vale a pena a
releitura!
Há pouco mais de um mês um grupo de alunos no 9º ano da Escola
Municipal Presidente Tancredo Neves, localizada em Ubatuba, obteve o feito inédito
de participar de uma feira espacial no Japão. O que chama a atenção é a idade
desses jovens, entre 13 e 15 anos, que integram o projeto UbatubaSat.
Essa não
foi a primeira vez que o grupo teve a oportunidade de viajar para outros países
com o objetivo de apresentar o projeto que quer colocar em órbita um pequeno satélite,
o Tancredo-1, todo produzido por essa moçada. Com eles, professores de
Matemática e Ciências coordenam o projeto que recebe respaldo do Instituto
Nacional de Pesquisas Especiais (Inpe).
Essa história toda teve início em 2010 quando o professor de
Matemática Cândido Osvaldo de Moura, idealizador do projeto, leu uma nota na
revista Superinteressante onde a empresa Interorbital Systems, localizada em
Mojave, no deserto da Califórnia, Estados Unidos, vendia kits para a construção
de satélites, além de oferecer serviço de voo e colocar o equipamento em órbita
a bordo do foguete Netuno V.
Foi o que bastou para colocar a ideia em prática e encontrar
outra forma de ensinar Ciências. “Hoje se ensina Ciências da pior forma
possível, na base da decoreba, por isso esse projeto apareceu como uma
oportunidade de mudar esse conceito”, disse o professor que contou com a
receptividade dos colegas e da própria direção da escola.
O que ele não sabia é que esse grupo se tornaria um dos mais
jovens a participar de uma pesquisa dessa natureza e que tem levado o nome de
Ubatuba para o mundo, recebendo elogios de doutores e pós-doutores que
participaram da Feira promovida pela Agência Espacial do Japão (Jaxa) onde
apresentaram um artigo que expos todo o impacto do projeto na comunidade.
A
galera foi aplaudida de pé após a exposição da jovem Bruna Sakamoto, 14 anos,
que foi a escolhida para fazer a apresentação a esse grupo de especialistas.
Junto com ela, também participam da equipe João Gabriel, 14
anos; Glecia Alencar Rodrigues, 14; Shayene Cristina de Jesus Carmo, 13;
Rafaela Daniel Torres, 13; Nathalia Martins da Costa, 13; Juliana Cunha, 14; Maryanna Conceição, 15;
Lyandra Alves, 13; Amanda Araújo, 13; Pedro Henrique Domingues Oliveira, 14; e
Marcelo Angelo da Silva Filho, 14 anos.
Para chegar neste ponto foram pelo menos 20 reuniões com os
integrantes do grupo para a montagem, aplicação e tabulação da pesquisa que,
aliás, foi considerada a parte mais difícil para essa moçadinha. Depois disso,
a inscrição em uma revista científica e o aceite do artigo de cinco páginas.
Mas essa turminha também teve a oportunidade de visitar o
Jet Propulsion Laboratory/Nasa (Agência Espacial Americana), e participar de
cursos no Inpe. No Japão, ainda tiveram direito a um estande onde puderam
mostrar o projeto desenvolvido há três anos. “Com certeza foi um dos mais
visitados”, vangloria o idealizador Cândido de Moura que tem a seu lado os
professores de Matemática, Patrícia Patural, e os de Ciências, Marilea Borine
D´Angelo e Rogério Stojanov Bueno.
Início
O começo não foi fácil, mas desistência não estava no
vocabulário do professor que foi atrás de recursos para poder adquirir o kit de
satélite que custava US$ 8 mil.
Conseguiu a doação de um empresário da cidade.
A prefeitura ajudou contratando uma empresa que deu um treinamento para ensinar
os alunos a montarem a plaquinha inicial (componente eletrônico) para início da
construção do satélite e compra de equipamentos para a montagem do laboratório.
“Foi um ano ensinando e treinando os alunos a colocar cada componente no
local”. Hoje eles mostram uma habilidade ímpar no manejo dos equipamentos.
A meta da equipe era que o satélite fosse lançado no
primeiro semestre deste ano, mas o foguete da empresa que levará o satélite
para o espaço está atrasado. A expectativa agora é para este segundo semestre e
os participantes do UbatubaSat já têm o modelo de voo construído no Laboratório
de Integração e Testes (LIT) do Inpe. “Mas esse modelo está atrelado ao
lançamento”, diz Moura.
Esse protótipo deve levar um gravador de chip com uma mensagem
a ser escolhida em concurso envolvendo toda a escola, que será transmitida de
órbita e captada na Terra. Mas já há estudos para um segundo experimento com o
Inpe para ser lançado em um ano e meio.
Aventura
Pra chegar ao Japão o grupo contou com apoio da Unesco e da
Prefeitura de Ubatuba para cobrir os custos com passagens e hospedagem. Como
jovens que são, ainda descobrindo o mundo, os estudantes não titubearam ao
dizer o que acharam de mais estranho na viagem ao continente asiático: “a
comida no avião, frango doce e arroz sem sal”.
Com certeza isso vai ficar na
lembrança, assim como a aventura de Pedro Oliveira que se perdeu do grupo
quando esqueceu seu Ipad no trem-bala e voltou para buscá-lo. O resultado é que
o veículo partiu da estação e foi sentido Kioto enquanto o restante estava em
Nagoya. Foi uma correria só para achar o aluno que, da sua parte e gastando seu
inglês para conseguir retornar.
De tão nervosa, a professora Marilea Borine D´Angelo foi
multada em 10 dólares porque fumou na estação. O jovem foi encontrado uma meia
hora depois no setor de Achados e Perdidos. “Is this Candango”, foi a fala do
professor Cândido no reencontro.
Respeito
O trabalho desenvolvido na Escola Municipal Tancredo Neves
tem ganhado respeito em todos os lugares que passa a ponto de ela organizar a
Semana de Astronomia e Astronáutica que levou a Ubatuba, Marcos Pontes, o
primeiro astronauta brasileiro a ir para o espaço. Isso foi possível graças aos
cursos e participação na Olimpíada Brasileira de Astronomia (OBA).
O coordenador geral de Engenharia e Tecnologia Espacial do
Inpe, Dr. Márioo Quintino, que assessora o projeto, destaca a importância desse
trabalho até no sentido de ter mais profissionais na área.
“Todos os anos as
faculdades brasileiras oferecem 180 mil vagas em engenharia e apenas 30 mil
jovens se formam nesta área anualmente. Estima-se que apenas 25% deles estejam
realmente preparados para trabalhar com a moderna tecnologia”.
A primeira turma participante do UbatubaSat se forma no
final deste ano, sendo a maioria tendo na cabeça que quando crescer quer fazer
engenharia, da mecatrônica à civil, passando pela aeroespacial. Mas há quem
tenha sonhos com o jornalismo, a publicidade, o direito...
Mas o trabalho não
para porque os novos já estão aprendendo um pouco do projeto e aqueles que se
destacarem podem ser incluídos no projeto e, quem, sabe participar do
lançamento de novos satélites.